Maricá/RJ,

Ausência de negros nas esferas decisórias leva à falta de políticas públicas específicas



Rio de Janeiro – A baixa representatividade da população negra nas esferas de poder leva ao círculo vicioso da falta de acesso a esses postos e também à dificuldade de evolução na escala social. 

Para o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Marcelo Paixão, coordenador do Laboratório de Análises Econômicas, Históricas, Sociais e Estatísticas das Relações Sociais (Laeser) do Instituto de Economia (IE), quando uma pessoa de pele escura evolui na escala social, mais barreiras ele tem para desfrutar da condição conquistada. 

Ele lembra que não se pode deixar de lado o fato de que as práticas sociais existentes, independentemente das condições econômicas, não favorecem a mobilidade social ascendente da população negra. “Porque no Brasil houve uma espécie de consenso de que as melhores posições deveriam ser ocupadas por um determinado grupo de cor e um determinado grupo de sexo. E que as outras funções sociais de menor destaque, as mais precárias, essas sim, poderiam ser exercidas por pessoas negras. 

Na opinião do professor, não pode ser acaso que entre cantores e jogadores de futebol se encontrem tantos negros de destaque e em funções como na Confederação Nacional da Indústria e no Congresso Nacional não haja quase nenhum. “A abolição se deu há mais de 100 anos, já teria dado tempo de uma mudança ter se processado no país, se não existissem essas outras barreiras”. 

A assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Eliana Graça, lembra que essa dificuldade de acesso dos negros à estrutura de poder leva à falta de discussão da pauta política racial. 

“Os direitos e os interesses da população negra não conseguem chegar na estrutura de poder. A crença nossa é que você tendo essas pessoas ocupando espaços de poder, elas têm condições de [atender] as necessidades dessa população. Não tem um olhar com esse corte específico, quer dizer, a pauta política, de uma maneira geral, não atende a população negra, porque você não tem pessoas que defendam essa pauta”. 

A deputada federal Benedita da Silva vai além. Para ela, a exclusão prejudica o desenvolvimento de todo o país. 

“Como você perde um segmento que tem uma cultura forte, expressiva no campo da economia, da política, da ciência, da tecnologia. Os negros que vieram [para o país durante a escravidão] não eram analfabetos, como tentam passar historicamente. Tinham conhecimento [e havia entre eles alguns que eram] até reis e rainhas nos seus países respectivos, com sua língua, suas tradições”. 

Para Benedita, a representação racial na política tem melhorado, mas ainda esta muito longe do que seria ideal. Ela acredita que o negro está brigando mais para conquistar mais espaço, mas ainda está muito aquém dessa representação. 

“Você ainda pode dizer: fulano está ali, sicrano está lá. É uma conquista, não deixa de ser, mas você ainda pode [contar essas pessoas] nos dedos das mãos. O que nós buscamos é que daqui a um pouco mais seja uma coisa tão natural que não dê para [contar].” 

Para a secretária de políticas de ações afirmativas da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Ângela Nascimento, a dificuldade começa com a falta de acesso a diversos mecanismos que facilitam a entrada no poder político, como o ensino superior. 

“Na vida da população negra o acesso ao ensino superior foi mais difícil. Essa realidade começa a ser mudada com a política de cotas. O acesso a determinadas oportunidades de cargos públicos também foi mais difícil, tem sido ainda mais difícil para a população negra”. 

Ângela diz que a expectativa com a lei de cotas, que passa a ser agora para todas as universidades e institutos federais, aumente mais a participação da juventude que está acessando a universidade a outros cargos, “inclusive ao poder político”. 

Segundo dados do Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a proporção de pretos que frequentavam o ensino superior subiu de 2,3% no ano 2000 para 8,4% em 2010. Entre os pardos, o número passou de 2,2% para 6,7%. 

Edição: Tereza Barbosa 

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