O ESPELHO E A ALMA
Nádia (Sidewí) Chaia
Foto: Graça Bastos. Em Cabrobó-PE |
De acordo com Óscar
Ribas (Ilundo, 1989), existe a crença em Angola de que quando alguém morre a
alma não abandona o lugar onde o corpo é enterrado e segue, junto com ele,
sentada sobre o caixão, de costas para o cortejo, com as pernas esticadas e os
braços repousados sobre elas, com a cabeça balançado levemente de um lado para
outro. Para que ela seja vista, é necessário colocar-se a frente do cortejo,
com um espelho onde será gravada a sua imagem, sem, entretanto, despertar a
atenção da alma para que esta não o arrebate de imediato. Durante algum tempo
permanece sentada sobre o túmulo, depois
adentra na terra passando a “viver” no mundo invisível. Sempre que é necessário
consulta-la, os quimbandas especializados realizam um ritual que “levanta a
alma” para que a mesma se comunique. Ainda segundo o autor citado, “A alma,
após a morte, acompanha o corpo e com ele se fixa no seio da terra. Entretanto,
dá fé do que fazemos, e quando lhe apetece vem à superfície, preferencialmente
de noite, pois a luz a incomoda. E quando anda, seus pés não pisam o chão:
caminham no ar, a uns cinquenta centímetros de altura, mas deixando ouvir o
ruído de seus passos arrastados.”
Façamos uma viagem no tempo e no espaço agora e cheguemos
ao Brasil e a alguns de seus usos e costumes em casas de cultos
afro-brasileiros.
Até que completem, no mínimo, três meses de iniciados nas
roças de santo, como também são denominadas as casas de candomblé, os noviços
andam de branco, com a cabeça coberta e jamais se olham num espelho. Salvo por
questões de trabalho ou saúde, quando alguns rituais são realizados para que se
consiga permissão antecipada, até completar um ano de iniciação o noviço não
entrará em hospitais ou cemitérios. Nos três primeiros meses não elevarão o tom
de voz, não olharão diretamente nos olhos de seus mais velhos ou pessoas
estranhas. Não andarão sozinhos depois de meia noite, terão sempre, em caso de
necessidade, de ser acompanhados por um mais velho. Não pararão em bares ou
encruzilhadas. Aprenderão uma nova maneira de se comportar de modo a manter as
tradições e não ofender ou desrespeitar os ancestrais.
Se
observarmos com alguma atenção, notaremos que as proibições que foram
mencionadas são uma adaptação a realidade brasileira do que havia nas culturas
tradicionais de nossa Mãe África.
Nádia
(Sidewí) Chaia - Pesquisadora de culturas Bantu
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